A Ciência no Universo das Leituras
Cristhiane Cunha Flôr
Reginaldo Fernando Carneiro

DAS UTOPIAS
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos se não fora
A mágica presença das estrelas!
(Mário Quintana - Espelho Mágico)

 

O poema de Mário Quintana, utilizado como epígrafe, nos lembra de uma característica muito forte do fazer científico, que é a capacidade de almejar o conhecimento distante, aquele que, por ora, nos parece inatingível. Imaginar, criar, ser curioso... Essas são facetas imprescindíveis para a criação de um espírito científico.

Como vimos em outros textos deste Caderno, a ciência se faz numa contínua revisão das ideias e visões de mundo e, para isso, é necessário haver espaço para as utopias! No documento Elementos Conceituais e Metodológicos para a definição dos Direitos de Aprendizagem (BRASIL, 2012), é indicado que entre os direitos para a área das Ciências da Natureza está o de ampliar a curiosidade das crianças, desenvolver a criatividade e estabelecer relações da ciência com outras formas de linguagem. Neste texto buscaremos trabalhar esses direitos à luz de um tema também inspirado pelo poema de Quintana: “a mágica presença das estrelas”, por meio de considerações a respeito do Sistema Sol e Terra.

É possível trabalhar o eixo Sistema Sol e Terra com as crianças do Ciclo de Alfabetização a partir da leitura de literatura e materiais com base em outras linguagens, aproveitando o potencial poético e simbólico desse tema para transitar com elas por diferentes textos. O Caderno 01 de 2013 do PNAIC Língua Portuguesa apresenta a importância desta forma de trabalhar com diferentes textos para desenvolver capacidades de compreensão e produção de textos orais e escritos.

Cabe aqui uma importante conversa sobre a visão que temos do papel da literatura assim concebida no ensino de Ciências Naturais. Não se trata de utilizar literatura infantil, por exemplo, tendo como foco apenas os conceitos científicos. Esta forma de lidar com os diferentes textos em sala de aula empobrece todo o processo, pois faz uma verdadeira assepsia no texto literário, buscando a ciência e possíveis conceitos científicos apresentados e furtando às crianças o prazer da leitura, na perspectiva trabalhada nos Cadernos de Formação de Professores do PNAIC 2013. Tampouco faz sentido ler poemas, mitos ou textos da tradição oral para mostrar como esses pensamentos estão errados, reforçando a ideia, falsa, de que somente a ciência tece uma narrativa correta a respeito dos fenômenos naturais. Trata-se de oferecer textos diversos para que, a partir dessas leituras, em um movimento de construção de seu papel de leitor diante de diferentes textos, as crianças possam compreender que a ciência tem linguagem e formas próprias de falar sobre esses objetos.

Tomemos, como exemplo, o tema da origem do Universo. A humanidade, desde os tempos mais remotos de sua existência, buscou formas de explicar sua origem e também a origem do ambiente que a cerca. Questões como “Quem somos”? e “De onde viemos”? fizeram parte de nossos questionamentos mais profundos – e o fazem até hoje. Na busca por compreender essas questões, em diferentes épocas e lugares, foram concebidos calendários solares e lunares, formas de orientação geográfica baseadas na posição de estrelas, enfim, uma série de artefatos tecnológicos foi surgindo em diferentes culturas, com base em sua concepção de mundo. Ao mesmo tempo, essas sociedades criavam mitos sobre a origem da Terra e do Universo baseados em suas visões de mundo, as quais eram muitas vezes passadas para as gerações futuras pela tradição oral.

Origem do mundo

Um mito indígena nheengatu, da Amazônia, descreve a origem do mundo:

No princípio havia só água e céu.

Tudo era vazio, tudo noite grande.

Um dia Tupana desceu no meio do vento e quando já ia encostar na água saiu do fundo uma terra pequena, pisou nela.

Nesse momento Sol apareceu no tronco do céu e Tupana olhou para ele.

Quando Sol chegou no meio do céu o seu calor rachou a pele de Tupana, e a pele de Tupana começou a escorregar pelas pernas.

Quando Sol ia desaparecer para o outro lado do céu a pele de Tupana caiu do corpo e estendeu-se por cima da água para já ficar terra grande.

No outro Sol [no dia seguinte] já havia terra, ainda não havia gente.

Quando Sol chegou no meio do céu, Tupana pegou uma mão cheia de terra, amassou bem, depois fez uma figura de gente, soprou-lhe no nariz e deixou no chão.

Essa figura de gente começou a engatinhar, não comia, não chorava, rolava à toa pelo chão.

Ela foi crescendo, ficou grande como Tupana, ainda não sabia falar.

Tupana, ao vê-lo já grande, soprou fumaça dentro da boca dele, então começou já querendo falar. No outro dia Tupana soprou também na boca dele, então, contam, ele falou. Ele falou assim:

– Como tudo é bonito para mim! Aqui está água pra esfriar minha sede. Ali está fogo do céu pra aquecer meu corpo quando ele estiver frio. Quero brincar com água, quero correr por cima da terra; como o fogo do céu está no alto, vou falar com ele aqui de baixo.

Dizem que Tupana estava junto dele, mas ele não viu Tupana.

Adaptado, retirado de <http://www.ghtc.usp.br/Universo/cap01.html>, acessado em 22 de fevereiro de 2015.

Este é apenas um trecho do mito nheengatu, que é muito mais longo e explica como surgiram as plantas, os animais, e muitos outros temas de importância para a construção das visões de mundo dos povos indígenas. Observe que com esse texto podemos conduzir práticas pedagógicas articulando história, geografia e língua através da oralidade, como é pontuado no Caderno de Apresentação de Língua Portuguesa. É importante que o professor consulte a fonte indicada para a leitura do texto original.

A respeito dos mitos, é importante lembrar que sua elaboração faz uso da linguagem metafórica, baseada em símbolos que muitas vezes só fazem sentido dentro de determinada cultura. É por esse motivo que não se podem comparar os mitos ou buscar entre eles o mais “verdadeiro”.

É possível solicitar, a partir da leitura de mitos (ou anteriormente a essa leitura), que as crianças busquem, em seu meio social, outras explicações para a origem do Sol, da Terra, das estrelas, e as socializem em rodas de conversa na sala de aula. Talvez as crianças tragam para a sala de aula aproximações às explicações científicas, pois é isso que é dito pelos pais ou visto em programas de televisão. É importante que perguntemos às crianças: Vocês ouviram falar desse assunto? Quem falou? O que vocês acham disso?

Trabalhar dessa forma com a leitura de mitos no Ciclo de Alfabetização permite o exercício da oralidade sobre temas das Ciências Naturais, incentivando as crianças a participarem de atividades de contação de histórias, sejam elas mitos, histórias que a família conta, vistas na televisão... Na perspectiva do letramento, é nas situações de leitura e produção de textos orais e escritos, de diferentes gêneros, que os indivíduos se apropriam dos conhecimentos a respeito deles e desenvolvem as capacidades necessárias para atingir diferentes propósitos de comunicação.

Nesse contexto, é importante tomar conhecimento sobre a Teoria do Big Bang, proposta pelo cientista George Gamow em 1947, como uma das respostas da ciência para as mesmas questões: De onde veio este mundo? Como ele surgiu? Para se informar sobre essa teoria, você pode assistir ao primeiro capítulo da série “Poeira das Estrelas”, exibida pela revista eletrônica Fantástico. Nessa série, Marcelo Gleiser fala sobre os mitos e teorias científicas de diferentes épocas sobre a origem do Universo. Você pode ainda ler o livro “A Dança do Universo”, também de Marcelo Gleiser, ou então o livro “Filhos do céu – Entre vazio, luz e matéria”, que traz uma conversa entre o filósofo Edgar Morin e o astrofísico Michel Cassé. Pode ainda ler o poema “O Homem, as Viagens”, de Carlos Drummond de Andrade, ou o livro de literatura infantil “A Pirilampéia e os dois meninos de Tatipurum”, de Joel Rufino dos Santos.

Perceba que, para sua própria formação e informação você pode, e deve, lançar mão de diferentes textos: o poema, o texto de divulgação científica, o artigo científico, o mito... Cada um desses textos é repleto de possibilidades interpretativas a respeito dos objetos sobre os quais discorrem, no caso, o Universo. Algumas dessas referências não precisam ser apresentadas diretamente aos alunos, porém, podem ser úteis na preparação e planejamento das atividades que serão feitas com as crianças.

Neste texto estamos conversando sobre ser possível, por meio da variedade de oferta de textos, perceber e permitir que as crianças percebam que a ciência é também uma possibilidade de entender e falar sobre o mundo.

A Terra é uma Bola Bailarina!

Atualmente a ciência descreve o Sistema Sol e Terra da seguinte forma: o Sol é uma estrela que, juntamente com outros corpos celestes, que estão sob seu domínio gravitacional, formam o sistema solar. Entre estes corpos, há oito planetas: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte (mais próximos), Júpiter, Saturno, Urano e Netuno (mais afastados).

Se existe um planetário em sua cidade, vale a pena visitá-lo com as crianças. Caso não tenha, é possível fazer uma visita virtual ao Planetário do Rio de Janeiro (ver seção “Para Saber Mais”).

Esse sistema é chamado Heliocêntrico, por ter o Sol como centro e os planetas desenvolvendo órbitas elípticas ao seu redor. Mas nem sempre foi assim. Antigamente pensava-se que o Sol, assim como as outras estrelas e planetas, girava ao redor da Terra. Esse sistema era conhecido como Geocêntrico, por ter a Terra em seu centro. Essas são formas resumidas de contar como a ciência, através dos tempos, descreveu esse sistema. Para relembrar e também conhecer essa história, assista ao vídeo Heliocentrismo (link disponível na seção “Para Saber Mais”).

Essas teorias nos fazem pensar nos movimentos terrestres. Uma boa fonte de informação para as crianças sobre esse tema é a série da TV Escola: De onde vem? (Especificamente o episódio De onde vem o dia e a noite? – Consulte a seção “Para Saber Mais”). O trabalho com desenhos animados, pequenos vídeos e documentários pode ser muito interessante, uma vez que, na perspectiva do letramento adotada pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, a criança precisa ter contato com os diferentes tipos de texto que circulam na sociedade, tanto no que diz respeito à forma, quanto ao conteúdo.

O software Google Earth também é uma forma muito interessante de inserir textos imagéticos sobre a Terra no Ciclo de Alfabetização, conforme apresentado no capítulo “Plugados no ensino de Ciência”. Por meio desse software você poderá explorar também conteúdos presentes no Caderno de Geometria do PNAIC 2014, como localização e coordenadas.

A série “Poeira das Estrelas”, por exemplo, mencionada anteriormente, é exibida na TV aberta e, de certa forma, contribui para a compreensão das pessoas a respeito da ciência e também do tema Universo. Porém, ao se trabalhar com esse material tendo como foco as Ciências, alguns cuidados precisam ser tomados.

No caso do episódio De onde vem o dia e a noite?, por exemplo, a Terra é representada sempre girando em torno de um eixo vertical, dessa forma:

Disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video?idItem=331>. Acesso em: 23 ago. 2014.

No entanto, não é bem assim... A Terra realiza dois movimentos simultaneamente:

• Rotação – movimento circular que a Terra faz em torno do seu eixo, no sentido anti-horário, que dura aproximadamente 24 horas, e dá origem ao dia e à noite;

• Translação ou Revolução – movimento elíptico que a Terra faz em torno do Sol, que dura 365 dias e 6 horas, ou seja, um ano. Assim, como um dia tem 24 horas, somando-se a fração que resta por ano (6 horas), a cada quatro anos é acrescido um dia ao mês de fevereiro e tem-se o ano bissexto. Contudo, isso nem sempre acontece: o ano terminado em 00 será bissexto apenas se for divisível por 400. O movimento de translação, juntamente com a inclinação do eixo de rotação, dá origem às estações do ano.

Perceba que, nas explicações dos dois movimentos, há uma questão importante para a futura compreensão, pelas crianças, da existência das estações do ano. O eixo imaginário em torno do qual a Terra gira é inclinado! E o desenho feito por Kika no episódio “De onde vem o dia e a noite?” não é o melhor modelo para este sistema. Veja ao lado a imagem da inclinação do eixo de rotação da Terra.

Voltemos a pensar, então, na introdução desses textos – vídeos, desenhos, filmes e documentários – em salas de aula. Deve-se evitar de trazê-los para a aula, para não expor os alunos a possíveis erros? Certamente não. A formação do leitor a partir de temas das Ciências passa pela construção da autonomia, pelo estímulo da curiosidade e, também, pela exposição a diversas perspectivas que abordam um mesmo fenômeno (algumas delas consideradas erradas, e o desafio consiste em perceber ou problematizar estes erros). Cabe então trazer para a sala de aula uma diversidade de textos sobre o tema, ou pedir que as próprias crianças tragam, dependendo da disponibilidade de fontes, para comparar os argumentos, discutir com elas as visões apresentadas e sintetizar as conclusões por meio do registro escrito. Tudo isso pode ser feito de diversas maneiras, mas salientamos que neste texto estamos fazendo uma abordagem de trabalho com professores, usando uma forma semelhante àquela que usaríamos com as crianças, mas focando em conteúdos que rapidamente extrapolam aquilo que é previsto para o Ciclo de Alfabetização.

Marcello Secco e Ricardo Roberto Plaza Teixeira, no artigo intitulado “Reflexões sobre uma experiência com desenho animado no ensino de física”, falam que não se trata de condenar produtores de desenhos animados que trazem questões que podem induzir a erros conceituais, mas sim pensar sobre maneiras de utilizar os equívocos para refletirmos sobre os conceitos científicos, o mundo que nos cerca e o mundo dos desenhos animados. É importante que, enquanto leitores, os estudantes percebam que não é porque foi dito em um documentário, reportagem, escrito em um jornal, que a informação é necessariamente verdadeira ou está correta.

No caso específico do conteúdo tratado no episódio De onde vem o dia e a noite?, é possível realizar a atividade experimental Duração do dia e da noite, apresentada no Projeto Ciência a Mão (Recursos para a Educação em Ciências da USP, consulte a seção “Para Saber Mais”). No site indicado, é possível encontrar softwares, materiais didáticos, atividades experimentais, livros e vídeos, entre outros materiais voltados para o ensino de Ciências. E já que estamos falando de websites enquanto fontes de informação para ensinar Ciências, é muito importante estar atento para, ao fazer pesquisas na internet, buscar sites de universidades, associações e sociedades científicas, revistas de divulgação científica conhecidas, enfim, fontes confiáveis. Isto garante a veracidade das informações veiculadas? Não. Mas é diferente de buscar as informações no blog de um leigo, por exemplo.

Retomando a questão anterior, a inclinação da Terra em relação ao seu eixo de rotação e o movimento de translação fazem surgir as estações do ano – primavera, verão, outono e inverno. É também possível trabalhar essas temáticas discutidas até aqui com a entrada de músicas em sala de aula. A música Bola Bailarina “de Thema Chan” (ver “Para Saber Mais”) permite conversar com as crianças sobre os movimentos da Terra, a sucessão dos dias e noites, etc.

A Terra é uma bola grande, muito grande

Onde as mais incríveis histórias acontecem...

Terra redonda, Terra bailarina

Que gira em torno do sol e de si mesma

E enquanto ela gira

É noite

É dia

É noite

É dia

É noite

É dia

Bola bailarina

Terra Azul

Bola bailarina

Terra Azul

 

Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=25271>. Acesso em: 15 ago. 2014.

A entrada da música, enquanto gênero textual, no ensino de Ciências no Ciclo de Alfabetização é repleta de possibilidades, pois permite pensar o conhecimento científico de forma lúdica, prazerosa e estimulante. Barros, Zanella e Araújo-Jorge (2013) nos lembram que as músicas povoam nosso cotidiano, traduzindo sentimentos, emoções, situações, informações acerca do mundo em que vivemos. É muito importante considerarmos que não é o caso de usar as músicas para trabalhar ou mesmo decorar nomes e conceitos – como muitas vezes é feito por meio da elaboração de paródias, que tornam a música um recurso para memorização, que incute na criança a visão da leitura enquanto repetição do que já está posto.

O cientista Carl Sagan disse – e pode ser visto no vídeo “Pálido Ponto Azul” “Para Saber Mais” – que a astronomia é uma experiência de humildade e criadora de caráter, uma vez que, ao olhar de fora, podemos perceber a insignificância de nosso planeta diante de todo o Universo. Nesse vídeo podemos perceber que é possível fazer ciência, e falar disso, de uma forma muito poética. Isso permite que futuras gerações façam, por sua vez, uma ciência mais próxima da poesia, da sensibilidade, enfim, de características que marcam nossa existência enquanto seres humanos. A beleza do conhecimento está em nossa forma de olhar para o mundo, que não precisa ser distante nem tampouco utilizar-se de uma linguagem hermética para comunicar.

Histórias em quadrinhos... Saindo das sombras

Sabemos, pela experiência do dia a dia, que a rotação da Terra faz modificar ao longo do dia a sombra de tudo que está nela, inclusive a nossa. Assim, pode-se discutir com as crianças sobre a luz e a sombra. Afinal, o que é a sombra? Uma definição possível nos diz que a sombra é uma região escura formada pela ausência parcial da luz, proporcionada pela existência de algum obstáculo.

Vamos pensar um pouco sobre como esse conhecimento aparece em nossas salas de aula. As crianças adoram fazer brincadeiras com a própria sombra, criando bichinhos com as mãos, por exemplo, ou correndo da sombra. Brincar com a sombra é uma forma bem interessante de propor atividades sobre esse tema com as crianças e podemos encontrar em histórias em quadrinhos situações desafiadoras para pensar esse fenômeno. Será que nossa sombra pode desistir de nós e ir embora? Em uma história da Mônica, personagem de Maurício de Souza, a sombra dela a abandona e fala, entre outras coisas, que sofre muitas maldades: ter que se esticar quando o sol está se pondo, ter que passar por poças de água e lama, etc. A partir dessa ideia é possível problematizar com as crianças situações nas quais elas se encontrariam sem a sombra, ou com a sombra delas vivendo sozinha: o que aconteceria? Pode a própria turma criar uma História em Quadrinhos descrevendo as diversas situações. Uma pergunta importante é: as sombras de todos os objetos variam sempre de tamanho?

Rodolpho Caniato escreveu uma história muito interessante sobre a curiosidade de um menino e os tamanhos das sombras! Você já ouviu falar que, ao meio-dia, o sol está a pino? Joãozinho da Maré, um menino muito curioso, ouviu isso de sua professora de Ciências que sol a pino “É quando o sol passa bem em cima das nossas cabeças. É quando a sombra da gente fica embaixo dos nossos próprios pés”. Curioso que era, resolveu observar se isso realmente acontece. Veja o que aconteceu lendo o texto adaptado abaixo (CANIATO, 1992, p. 29-30):

Ao ouvir a professora falar que quando o Sol passasse a pino seria meio-dia e não haveria sombra, Joãozinho pensou que seria uma boa hora para acertar o relógio.

Ao sair da sala, no fim da aula, como já era quase meio-dia, decidiu observar o que a professora acabara de ensinar. Joãozinho juntou-se aos amigos e se postaram ao Sol para vê-lo passar a pino, mesmo com a escola fechada.

A sombra ainda estava grande. Também, ainda não era meio-dia. Era preciso esperar a sombra encurtar. Chega meio-dia. Os guris conferem com os relógios das pessoas que passam. Já era meio-dia. A sombra ainda estava grande. A turma percebe que, em lugar de encurtar, a sombra começa a aumentar de comprimento e mudar de direção...

No dia seguinte, Joãozinho e seus amigos resolvem acompanhar a sombra desde cedo para não perder o momento em que ela deveria passar por baixo de seus pés. Era preciso faltar à aula. Sempre um dos amigos ficaria de plantão para não perder o momento do Sol a pino.

Depois de vários dias de tentativas frustradas de ver o Sol a pino, ou o que é a mesma coisa, ver as sombras desaparecerem sob os próprios pés, os guris desistiram.

Alguns dias depois, Joãozinho e seus amigos voltam à escola. Desta vez não era por causa da merenda, eles queriam esclarecer o caso do Sol a pino ou sem pino.

– Fessora.

– Que é Joãozinho?

– A gente não conseguimos ver o Sol a pino, não.

– Vai ver que vocês não olharam bem.

– Fessora, mostra pra gente esse negócio. A gente queria vê.

– Eu não tenho tempo pra isso, meninos. Tenho que sair correndo pra dar outra aula. E tem outra coisa, faz 15 anos que eu dou essa aula e nunca ninguém me amolou tanto quanto você e seus amigos.

– Num tem nada não, Fessora, a gente só queríamos intende.

Alguns meses depois. Já se aproximava do fim do ano. (...) e seus amigos já haviam esquecido o episódio do Sol a pino. A aula terminara. Faltava pouco para o meio-dia. Os garotos saem e, de repente, Joãozinho grita:

– Ei, turma, vem vê! A sombra tá quase sumindo embaixo da gente! O Sol tá quase a pino! – Vamo espera mais um pouco! Vamo vê o Sol a pino!

Em pouco tempo os moleques irrompem num grito de entusiasmo: a sombra desaparecera! O Sol estava bem a pino, no meio do céu. Todos olharam pressurosos para o relógio da professora, que também acorrera... Não era meio-dia... Que decepção!

Essa curiosidade explicitada por Joãozinho é que queremos estimular em nossas crianças ao ensinar Ciências. Muitas vezes, a escola faz exatamente o contrário, desestimulando e calando os questionamentos dos alunos. Você sabe o que é sol a pino? Já viu o sol a pino? Sabe como e quando isso acontece aqui no Brasil? Agora é com você... Procure saber mais buscando as informações em diferentes fontes!

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Algumas considerações

 Nesse texto trabalhamos com a diversidade de textos, a propósito de temas das Ciências, no Ciclo de Alfabetização, pensandos numa perspectiva ampla, desde os chamados livros de literatura infantil até vídeos, histórias em quadrinhos, mitos e músicas. Depois disso tudo, consideramos importante lembrar que, em sua vida escolar, a criança vai estudar esse tema recorrentemente, em diferentes pontos da Educação Básica e em diferentes disciplinas (como Ciências e Geografia no Ensino Fundamental, Física e Geografia no Ensino Médio). O mesmo serve para os diferentes textos, passíveis de serem trabalhados, relacionados a temas de Ciências, pensando a perspectiva do letramento. É importante lembrar, então, que o professor não precisa dar conta de todas as abordagens possíveis no Ciclo de Alfabetização. As possibilidades de textos e atividades que trouxemos não devem ser vistas como receitas a serem seguidas: cada turma, realidade e contexto demandarão planejamentos e recortes específicos.

É fundamental considerar que apesar do foco desse texto ser a leitura, esta não deve ser dissociada da escrita. Então, sempre que possível, o professor deve entrelaçar atividades de leitura com atividades de escrita, individual ou coletiva, de forma que o processo de construção de conhecimentos em Ciências esteja sempre acompanhado do necessário registro. Finalmente, não falamos sobre os alunos público-alvo da Educação Especial, mas entendemos clara a mensagem já apresentada nos Cadernos do PNAIC de que, de modo geral, não há diferenciação em relação às atividades aqui propostas, cabendo a adequação necessária, através dos recursos apropriados, de modo a estabelecer a comunicação com estes alunos.

Referências

BARROS, Marcelo Diniz Monteiro de; ZANELLA, Priscilla Guimarães; ARAÚJO-JORGE, Tania Cremonini de. A música pode ser uma estratégia para o ensino de Ciências Naturais? Analisando concepções de professores da educação básica. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, v. 15, n. 1, p. 81-94, 2012.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Elementos conceituais e metodológicos para definição dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento do Ciclo de Alfabetização (1.o, 2.o e 3.o anos) do Ensino Fundamental. Brasília, MEC/SEB, 2012.

CANIATO, Rodolpho. Com Ciência na Educação. 3. Ed. Campinas: Papirus, 1992.

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