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Tópico V - Territórios da Mídia: Construindo Informação e Imagens Espaciais

A questão, portanto, não é classificar o funk como boa ou má música, nem fazer com que todos gostem desse estilo musical ou o odeiem. O papel da escola não é  tentar fixar e reproduzir o que se elege por correto ouvir, dançar ou gostar, mas também não se pode cair na ilusão de que tudo o que surge dos meios populares deve ser valorizado, nem que toda a produção cultural que herdamos deve ser esquecida. A questão é saber interpretar as novas expressões culturais no contexto espacial em que elas são gestadas e perceber como tais expressões podem contribuir para que todos melhor se orientem perante a complexidade espacial da sociedade.


Para isso, o diálogo deve se dar envolvendo todos, para que o preconceito não seja um elemento definidor na criação de muros que isolem os grupos culturais em suas supostas verdades. Nesse aspecto, tanto os apreciadores do funk podem se apropriar de uma herança cultural brasileira, que pode contribuir para enriquecer a estética funk, quanto os que não apreciam o funk podem ampliar seus referenciais estéticos e políticos, ao melhor compreender o contexto espacial que se repercute nesse estilo de música e dança
.

 

Não é desqualificando ou negando o gosto do outro que impediremos o fenômeno de acontecer espacialmente, nem é a oposição proibitiva uma postura produtiva na esfera escolar. Reforçamos a ideia de que é preciso localizar-se diante dos fenômenos que fazem parte do cotidiano de nossos(as) alunos(as) e de que dedicar-se à sua compreensão faz com que a escola se torne um ambiente de coocorrência de saberes. Assim, o papel do professor é articular os saberes locais com os saberes institucionalizados, para que todos possam melhor se orientar no mundo.

Nessa tarefa, quando se faz uso das novas mídias, toda a potencialidade que elas apresentam para interagir e para viabilizar a fuga das imagens dominantes e limitadas da grande mídia exerce força contra preconceitos e ideias já formatadas. No caso do funk, por exemplo, o espaço de troca criado pelas tecnologias digitais de comunicação possibilita, aos que gostam desse estilo musical, entender o contexto que os levou a gostar, e, aos que não gostam, entender por que não se identificam com esse fenômeno e por que a relação com o funk é diferente para os “outros”.

Caso não nos esforcemos para entender quem é o outro, nunca saberemos de fato quem somos e continuaremos a perpetuar fronteiras culturais que só nos prejudicam por não aprendermos com o diferente o que o outro representa para nós.

 

A questão não é acabar com as diferenças culturais, mas sim com as sociais e econômicas. Temos de subverter o sentido de fronteira como algo que separa e isola, como as barreiras econômicas e ideológicas colocam, e entender esse conceito como aquilo que coloca os diferentes em contato: um entre-lugar em que as trocas se tornam possíveis. Assim, sem deixar de sermos nós, crescemos mutuamente com as diferenças que nos enriquecem.

Para isso, a forma de dialogar é que deve ser transformada na direção do respeito à diferença, da busca mútua por identificar os potenciais e os limites de cada expressão cultural. Para tal, é fundamental fazer uso da internet como fuga da reprodução das ideias fixas, que ignoram o outro e deturpam a imagem que temos de nós mesmos(as).

Agora vamos ler o texto O funk é feminista

 

O texto busca expressar o sentido do funk para um novo feminismo. Após questionar a ideia uniforme e generalizante de que o funk tem letras sexistas e representa mulheres como objeto, indica que a juventude está gostando dessa música também por apresentar outras possibilidades para o feminismo. Ao final, aponta que o movimento feminista é plural, sem hierarquia, dogmas, controle ou estruturas centralizadas, que não defende uma verdade, mas está em permanente construção de uma agenda em evolução.

Dessa forma, é possível perceber que não podemos generalizar e uniformizar todo o funk, mas perceber que, entre o machismo praticado no contexto espacial em que esse estilo musical é gestado, as mulheres estão criando devires minoritários de resistência e fuga para assumirem sua sexualidade

 

É isto que a escola deve procurar fazer: investigar com os(as) alunos(as) outras interpretações possíveis, que nos levem a superar o pensamento uniformizador, hierarquizante, que divide esses fenômenos espaciais entre corretos e  incorretos.

Se as mulheres estão ouvindo, cantando e dançando o funk, não é só porque são vítimas do machismo, mas também porque estão querendo dizer alguma coisa a partir das condições espaciais em que suas falas são construídas. Se o respeito às diferenças permitir que as suas falas tenham seus sentidos ampliados para além da reação ao território imediato, os que não vivem essa realidade poderão também ampliar a compreensão espacial do mundo por meio das letras de funk.

 

Devemos evitar formas fechadas e prontas de pensar, isto é, evitar o impulso de enquadrar tudo em uma generalização simplista, como a grande mídia tenta fazer, ou como a educação maior tenta reproduzir como única verdade. Veja bem, a grande mídia tende a reduzir o funk a uma mercadoria, pois vende músicas e imagens, mas, se as pessoas que vivem a realidade do funk forem reduzidas a mercadorias, estarão subsumindo-se nas forças que os marginalizam.

Pois a mesma mídia que aceita o funk enquanto mercadoria também o toma como algo inferior culturalmente.

 


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